quarta-feira, fevereiro 27, 2008

Halliburton, Petrobras e os notebooks

Terra Magazine - Como e o que de fato aconteceu no caso das informações, dos dados furtados da Petrobras?
José Sergio Gabrielli - Existe um poço de exploração, qualquer um, e ali há uma atividade de exploração. Tem uma sonda com um equipamento pequeno no meio. Esse equipamento, que está na sonda, perfura, faz um processo de recolhimento de informações, de perfilagem, como é chamado...

Como se fosse uma broca de dentista gigante?
Essa sonda é um espaço duas vezes maior do que o tamanho dessa sala (NR: então, de saída, pelo menos uns 70 metros quadrados) onde em cima dela você tem vários equipamentos. Tem dois ou três trailers, cabines (NR: que se tornaram conhecidos no caso como containers), e dentro deles todo um equipamento, conexões, etcetera. Elas, as cabines, são conectadas a equipamentos vários e se trabalha lá dentro.

Ok, então estamos na sonda...
Esse equipamento na sonda, que você chama de broca, faz um perfil do poço levantando dados sobre a formação geológica, temperatura, pressão, composição mineral, testes químicos... tudo isso vai sendo feito no percurso dessa espécie de parafuso que vai recolhendo muitos tipos de informações. Essa perfilagem é feita através de um tubo de aço que segura o poço. Hoje tem duas tecnologias, recentes, para isso...

Quais são?
Chamam-se LWD e MWD. (NR: Logging While Drilling e Measurement While Drilling, ou seja, perfuração direcional e perfuração inteligente). Os equipamentos na ponta da sonda captam o perfil de tudo ao mesmo tempo em que vão perfurando. Recolhem os dados enquanto perfuram. Todo poço em exploração faz isso. Os poços de produção não necessariamente. No Brasil...

Quantos são os poços no Brasil?
Hoje são 9 mil poços em produção. Mas do que estamos falando aqui é exploração, não produção. Bem, essa cabine pertence à empresa que faz o trabalho.

No caso, a Halliburton?
Sim, no caso a Halliburton. Geralmente, a empresa que faz o trabalho não é a dona da sonda, ela apenas faz o trabalho. Isso tudo dentro do trailer (NR: o tal "container"), ali tem computadores, telefones, equipamentos vários, e isso não desembarca, não é para ser desembarcado. O LWD, a perfuração, gera um volume gigantesco de dados, informações que só podem ser analisadas com softwares específicos.

Não é pra qualquer um...
Não, não. Tem que ter softwares específicos, muito sofisticados.

Mas é possível que alguém tenha esses softwares e consiga decodificar?
Sim, é possível, possível é, mas tem quer ter os softwares e muito conhecimento...

Sigamos...
Num processo normal, essa cabine é embarcada quando começa a perfuração de um poço e desembarcada quando termina. A cabine, o trailer, então vai para uma outra sonda, no mar, sem passar por terra. E, importante, antes de ser enviada para uma outra sonda no mar, todas as informações, os dados colhidos, são remetidos para a Petrobras.

De que forma são remetidos?
Ou via on line, quando são dados mais rápidos, em menor quantidade, ou em HDs (NR: discos rígidos) especiais, através de pessoas especialmente designadas para isso.

Por que não vão sempre on-line?
Porque às vezes só fisicamente. Às vezes é tão grande o volume de informações que só fisicamente. Imagine um terabyte de dados! E isso enviado por um computador... (NR: Um terabyte equivale a 1.099. 511.627.776 bytes. Ou seja, um trilhão de bytes. A grosso modo, pois há compressões, descompressões, um byte corresponde a uma letra, a um caractere) Bem, quando se desembarca qual é e tem sido o procedimento em milhares de casos?

Essa é uma boa pergunta...
O trailer (NR: o "container") é lacrado, com tudo dentro. Se fosse uma situação em que uma sonda estivesse em algum lugar isolado, se fosse uma situação com uma única sonda na região, se fosse a única sonda, o dono da sonda faria o desembarque. Mas, como no Brasil há muita sonda sob contrato da Petrobras, muito equipamento, nós mesmos transportamos...

Por quê?
Porque se não for assim fica muito caro, porque temos 240 mil toneladas de carga/mês feitas pelas 150 embarcações que se envolvem nesse transporte. Todo tipo de carga. Incluindo trailers. Esse é o processo. Você lacra esse trailer e em cada etapa é checado o lacre. Isso é importante, esse é o transporte da estrutura. Podemos melhorar o sistema?

Essa é outra boa pergunta...
Sim, podemos melhorar o sistema. Podemos, e devemos, não ter informação alguma mais contida aí. Aprendemos isso agora, não temos que ter mais informação guardada aí, mas isso funciona assim no mundo inteiro.

O que aconteceu no caso dessa sonda, desse furto?
Uma particularidade. Ela teve que encostar no Poliporto (NR: no Rio de Janeiro) para fazer uma manutenção regular. Então, todos os equipamentos foram desembarcados para terra. Os trailers foram para o terminal de cargas lá no Rio de Janeiro. O container (o trailer) é colocado, durante a viagem, dentro de uma grade de aço porque no mar tudo isso bate muito, tem essa grade de proteção. Esse container é que teve arrombados o cadeado e o lacre.

Enfim, o furto...
...a Petrobras tem um parque de máquinas, computadores, mais de 15 mil laptops. Já tivemos alguns roubos... pode ser roubo comum?

É outra das perguntas vitais...
Pode. Como hipótese, pode. Quem conhece, sabe o que tem ali. Pode, outra hipótese, ser um furto de quem está em busca de informações específicas? Pode ser um furto em busca de informações geológicas, litológicas...? Sim, pode ser. Alguém que quer uma avaliação mais precisa? Sim, pode ser.

Outra pergunta. O poço é o Júpiter?
Sim, vou confirmar: é Júpiter. Um poço de gás e condensado...

E qual é a estimativa?
Sem estimativa ainda, só foi perfurado um poço até agora. As informações específicas do poço interessam ao concessionário da área, que é a Petrobras. Mas, pode ter informações que sirvam a outros interesses?

Outra pergunta fundamental, de um ótimo jornalista...
Sim, pode ter informação que sirva a outros interesses; por exemplo, para quem se interessa pela compra de uma área próxima. Mas isso tem que se investigar: a quem interessaria?

Sim...
Frente a esse quadro, o que fazer? Quais são as lições desse caso? Primeiro, melhorar nossos controles. Manter os equipamentos a bordo, como tem sido a regra, não a exceção, mas garantir, isso é importante, garantir que o desembarque só aconteça quando tudo estiver limpo de informações, de dados, daquilo tudo que já foi remetido, enviado para a Petrobras. Nesse caso, isso não aconteceu. Não estava limpo. A empresa que gerou os dados, no caso a Halliburton, ela mantém um backup desses dados...

Ela tem um contrato específico para isso?
Tem...

Esse que foi assinado em agosto último?
...ela tem um contrato específico.

A Halliburton tem um backup, mas ela pode ficar de posse desses dados depois do trabalho encerrado? É um backup provisório?
Não, ela não pode ficar de posse. Ela só tem a posse quando faz o trabalho, nós ordenamos que ela apague tudo. Ela não pode reter as informações. E estas informações se tornam públicas dois anos depois, pela Agência Nacional de Petróleo (ANP). Disponíveis para qualquer um, para quem vai disputar um poço numa licitação. O que há para se fazer agora? Investigar. Estamos colaborando em tudo, esperamos que a Polícia chegue ao autor, ou autores, do furto.

Como tem muito jornalista chutando ou, pior, boiando, sem saber de nada, uma última pergunta: o que foi furtado? Quantos?
...bem...foram furtados quatro laptops, dois HDs e dois pentes de memória. Outra pergunta que se faz: por que demorou doze dias para o trailer sair da sonda e chegar em Macaé? Porque o transporte não é apenas para o trailer. O trailer é habitável.... De resto, quanto às questões policiais, não discuto porque não me cabem.

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E assim Gabrielli resume.
Não me perguntem mais nada, por favor... rs

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