sábado, setembro 15, 2007

Boa noite!... E tu dizes – Boa noite.
("Boa-noite", Castro Alves)


Sentiu o peito encher-se com a dor da espera. A dor que dilacerava cada célula de seu corpo.
Horas antes, esquecera a dor afogando-a em comida, bebida e sorrisos. Gargalhadas altas, dispersas, como a dizer "Olhe para mim. Mas olhe bem. Eu estou aqui. Eu vim por você, mas não preciso de você."
E ele olhara. A cada sorriso, ele olhara e sorrira de volta. A cada gargalhada, os olhos dele espandiram-se. E a cada olhar, ela sentira novamente a dor da espera.
A noite toda passara desviando-se de seus olhares. A noite toda escondeu-se nos abraços e nos braços de todos os outros com que dividia a comida, bebida e os sorrisos. Escondera-se, mas não desviara os seus próprios olhos, cativos dos dele.
Por um momento, alguns minutos, os olhares traduziram-se em palavras.
- Você estava errado, eu não mando em você., dissera, presa a seus olhos e seu sorriso fino que abria-se agora em uma interrogação.
- Ah não?, perguntara ele, o mesmo sorriso enigmático, os olhos ainda fixos nos dela. Os olhos que sabiam o que ela pensava, que despiam seus sentimentos e expunham-nos na mesa, perante todos. "Observem. Eis aqui o que ela quer. Guardem esse momento, pois ele é único. Meus olhos entendem cada pedaço dela e agora eu divido isso com vocês."
O enigmático do sorriso prendera-se a ela e potencializara a dor. Uma fração de segundo fora tempo suficiente para ela alimentar-se naquele sorriso, e ser torturada por aqueles olhos que, tranquilamente, amansavam o desespero que estampara-se em seu rosto. Levantara-se cambaleando, olhos e boca em silêncio, mudos, incompreensíveis. E não tocara nele. Em momento algum tocara nele, suas células afogando-se em dor, em expectativa, em desconsolo, dependendo do toque. E não tocara nele.
Agora, depois de ter mantido a dor da espera controlada, ela derramava-se sobre seu peito, enchendo-a de temor. Sozinhos, na rua, ambos se olhavam, e se continham. Ela, falando; ele, em silêncio. E olhando-a. Olhando-a exatamente no meio de seu rosto, sem afastar-se. Um meio sorriso brincando em sua boca, e ela toda uma enorme expectativa, um gigantesco impulso controlado, precisando apenas de uma fagulha para acender-se toda e transformar-se em satisfação.
Conteve o impulso, conteve o medo. Dera-se em oferenda, sutilmente. Bastaria a ele aceitar. E ele aceitava, mas assim como ela não o tocara horas antes, agora ele também não a tocava.

Nenhum comentário: