terça-feira, abril 24, 2007

Não verifiquei se isso existe, mas que é o máximo, isso é. Fiquei até emocionada!

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Processo Número: 0737/05
Quem pede: José de Gregório Pinto
Contra quem: Lojas Insinuante Ltda, Siemens Indústria Eletrônica S.A e
Starcell

Ementa:
UTILIZAÇÃO ADEQUADA DE APARELHO CELULAR. DEFEITO. RESPONSABILIDADE
SOLIDÁRIA DO FABRICANTE E DO FORNECEDOR.

Sentença:

Vou direto ao assunto. O marceneiro José de Gregório Pinto, certamente pensando em facilitar o contato com sua clientela, rendeu-se à propaganda da Loja Insinuante de Coité e comprou um telefone celular, em 19 de abril de 2005, por suados cento e setenta e quatro reais. Leigo no assunto, é certo que não fez opção por fabricante. Escolheu pelo mais barato ou, quem sabe até, pelo mais bonitinho: o tal Siemens A52. Uma beleza! Com certeza foi difícil domar os dedos grossos e calejados de marceneiro com a sensibilidade e recursos do seu Siemens A52, mas o certo é que utilizou o aparelhinho até o mês de junho do corrente ano e, possivelmente, contratou muitos serviços. Uma maravilha! Para sua surpresa, diferente das boas ferramentas que utiliza em seu ofício, em 21 de junho, o aparelho deixou de funcionar. Que tristeza: seu novo instrumento de trabalho só durou dois meses. E olha que foi adquirido legalmente nas Lojas Insinuante e fabricado pela poderosa Siemens..... Não é coisa de segunda-mão, não! Consertado, dias depois não prestou mais... Não se faz mais conserto como antigamente! Primeiro tentou fazer um acordo, mas não quiseram os contrários, pedindo que o caso fosse ao Juiz de Direito. Caixinha de papelão na mão, indicando que se tratava de um telefone celular, entrou seu Gregório na sala de audiência e apresentou o aparelho ao Juiz: novinho, novinho e não funciona. De fato, o Juiz observou o aparelho e viu que não tinha um arranhão. Seu José Gregório, marceneiro que é, fabrica e conserta de tudo que é móvel. A Starcell, assistência técnica especializada e indicada pela Insinuante, para surpresa sua, respondeu que o caso não era com ela e que se tratava de "placa oxidada na região do teclado, próximo ao conector de carga e microprocessador". Seu Gregório: o que é isto? Quem garante? O próprio que diz o defeito, diz que não tem conserto.... Para aumentar sua angústia, a Siemens disse que seu caso não tinha solução neste Juizado por motivo da "incompetência material absoluta do Juizado Especial Cível - Necessidade de prova técnica." Seu Gregório: o que é isto? Ou o telefone funciona ou não funciona! Basta apertar o botão de ligar. Não acendeu, não funciona. Prá que prova técnica melhor? Disse mais a Siemens: "o vício causado por oxidação decorre do mau uso do produto". Seu Gregório: ora, o telefone é novinho e foi usado apenas para falar. Para outros usos, tenho outras ferramentas. Como pode um telefone comprado na Insinuante apresentar defeito sem solução depois de dois meses de uso? Certamente não foi usado material de primeira. Um artesão sabe bem disso. O que também não pode entender um marceneiro é como pode a Siemens contratar um escritório de advocacia de São Paulo, por pouco dinheiro não foi, para dizer ao Juiz do Juizado de Coité, no interior da Bahia, que não vai pagar um telefone que custou cento e setenta e quatro reais? É, quem pode, pode! O advogado gastou dez folhas de papel de boa qualidade para que o Juiz dissesse que o caso não era do Juizado ou que a culpa não era de seu cliente! Botando tudo na conta, com certeza gastou muito mais que cento e setenta e quatro para dizer que não pagava cento e setenta e quatro reais! Que absurdo! A loja Insinuante, uma das maiores e mais famosas da Bahia, também apresentou escrito de advogado, gastando sete folhas de papel, dizendo que o caso não era com ela por motivo de "legitimatio ad causam", também por motivo do "vício redibitório e da ultrapassagem do lapso temporal de 30 dias" e que o pobre do seu Gregório não fez prova e então "allegatio et non probatio quasi non allegatio". E agora seu Gregório? Doutor Juiz, disse Seu Gregório, a minha prova é o telefone que passo às suas mãos! Comprei, paguei, usei poucos dias, está novinho e não funciona mais! Pode ligar o aparelho que não acende nada! Aliás, Doutor, não quero mais saber de telefone celular, quero apenas meu dinheiro de volta e pronto! Diz a Lei que no Juizado não precisa advogado para causas como esta. Não entende seu Gregório porque tanta confusão e tanto palavreado difícil por causa de um celular de cento e setenta e quatro reais, se às vezes a própria Insinuante faz propaganda do tipo: "leve dois e pague um!" Não se importou muito seu Gregório com a situação: um marceneiro não dá valor ao que não entende! Se não teve solução na amizade, Justiça é para isso mesmo! Está certo Seu Gregório: O Juizado Especial Cível serve exatamente para resolver problemas como o seu. Não é o caso de prova técnica: o telefone foi apresentado ainda na caixa, sem um pequeno arranhão e não funciona. Isto é o bastante! Também não pode dizer que Seu Gregório não tomou a providência correta, pois procurou a loja e encaminhou o telefone à assistência técnica. Alegou e provou! Além de tudo, não fizeram prova de que o telefone funciona ou de que Seu Gregório tivesse usado o
aparelho como ferramenta de sua marcenaria. Se é feito para falar, tem que falar! Pois é Seu Gregório, o senhor tem razão e a Justiça vai mandar, como de fato está mandando, a Loja Insinuante lhe devolver o dinheiro com juros legais e correção monetária, pois não cumpriu com sua obrigação de bom vendedor. Também, Seu Gregório, para que o Senhor não se desanime com as facilidades dos tempos modernos, continue falando com seus clientes e porque sofreu tantos dissabores com seu celular, a Justiça vai mandar, como de fato está mandando, que a fábrica Siemens lhe entregue, no prazo de 10 dias, outro aparelho igualzinho ao seu. Novo e funcionando! Se não cumprirem com a ordem do Juiz, vão pagar uma multa de cem reais por dia! Por fm, Seu Gregório, a Justiça vai dizer à assistência técnica, como de fato está dizendo, que seu papel é consertar com competência os aparelhos que apresentarem defeito e que, por enquanto, não lhe deve nada. À Justiça ninguém vai pagar nada. Sua obrigação é fazer Justiça! A Secretaria vai mandar uma cópia para todos. Como não temos Jornal próprio para publicar, mande pelo correio ou por Oficial de Justiça. Se alguém não ficou satisfeito e quiser recorrer, fique ciente que agora a Justiça vai cobrar. Depois de tudo cumprido, pode a Secretaria guardar bem guardado o processo! Por
último, Seu Gregório, os Doutores advogados vão dizer que o Juiz decidiu "extra petita", quer dizer, mais do que o Senhor pediu e também que a decisão não preenche os requisitos legais. Não se incomode. Na verdade, para ser mais justa, deveria também condenar na indenização pelo dano moral, quer dizer, a vergonha que o senhor sentiu, e no lucro cessante, quer dizer, pagar o que o Senhor deixou de ganhar. No mais, é uma sentença para ser lida e entendida por um marceneiro.

Conceição do Coité, 21 de setembro de 2005
Gerivaldo Alves Neiva, Juiz de Direito

8 comentários:

Cristiano disse...

Muito bom o texto. Não sei como li tudo, hehehe...

Anônimo disse...

Porque não é meu, oras! Fosse meu, você teria parado na metade. rs

Anônimo disse...

Pra mim é mais um daquelas "lendas" da internet.
Eu cada dia mais estou a favor das empresas e contra o povão...

Impressionante o indice de jumentos por metro quadrado.

Pra mim tecnologia não é para todos e inclusão digital é atualmente um dos maiores canceres.

mas... é apenas minha opniao.

Anônimo disse...

... que eu não vou comentar, porque se comentar serei obrigada a mostrar que você está errado em vários aspectos, mas afinal, eu não sou a dona da verdade (e você aparentemente pensa que é)...

Resolvi praticar o amor universal. Ao menos é uma boa maneira de descobrir o tal vazio eterno que me persegue. Quem sabe não é isso que falta?

Então, caro j, você tem direito a sua opinião. Fazer o que, né? rs

Anônimo disse...

Dono da verdade? so estou comentando sobre o que vejo todo santo dia.

Pessoas querendo aparecer com seus Flogs e Videologs...

Pessoas no orkut disputando quem tem o maior numero de amigos no orkut...

Pessoas achando que comprar celular, computador e etc... é a mesma coisa que comprar pão.

Brasileiro não lê... Brasileiro não se informa...

Não é a toa que la fora somos considerados uma praga digital.

Anônimo disse...

"...praticar amor universal..."?

Que diabos é isso?

[juro que tentei não interpretar com segundas intenções, já que - na presença de estranhos (não conheço os frequentadores do seu blog) - sou educado e polido, mas... pow... é díficil com uma declaração pós hippie, pré-emo que vc fez!!!!!]

Anônimo disse...

Não quer dizer que eu vou sair dando pra geral não. Quer dizer que eu não vou mais fazer chantagem pedindo pras pessoas não serem ingratas, ou coisa do gênero.. rs

Os frequentadores do meu blog são os únicos que adorariam se você falasse essa besteira sem explicar entre colchetes depois.. Perdeu uma ótima oportunidade. =)

Anônimo disse...

"A nível de" ex-juiz leigo , "enquanto pessoa humana", eu li a sentença e adorei. Era o tipo de sentença que eu gostaria de ter proferido.

Quem está acostumado com a realidade das metrópoles nacionais - Rio e aquela outra - não sabe como a vida (e a Justiça) é diferente no interior.

Aliás, a sentença não é um exercício de retórica, é um instrumento para a satisfação dos conflitos de interesses. E para ser eficaz tem de ser compreensível. Imagina um marceneiro de Coité, interior da Bahia, entender "julgo procedente o pedido e condeno a parte ré a (...) sem custas nem honorários (...)". Por isso eu achei a sentença um show. Tenho dito! 8)